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Stranger Things – 3ª Temporada (2019) | Retornando à boa forma

Em 2016 a Netflix lançava um de seus maiores sucessos de audiência: a icônica Stranger Things, série criada pelos Irmãos Duffer que resgatava a deliciosa atmosfera dos anos 1980 de modo aplaudível.

Entretanto, apesar do considerável barulho que fez à época de sua estreia, o segundo ano falhou em manter o ritmo e a competência da narrativa, respaldando-se em diversos convencionalismos e saídas formulaicas para entregar um produto às pressas.

De fato, fomos levados a pensar que o show já sofria de um infeliz cansaço, preconizando sua nostálgica originalidade; porém, os criadores parecem ter aprendido com seus erros e, em 2019, voltaram ao topo das criações televisivas com uma habilidosa e emocionante narrativa.

Não foram apenas os Duffer que permaneceram em hiato durante dois anos, mas o próprio elenco da produção cresceu de forma considerável – e trouxe para as telinhas uma mudança comportamental visível e apaixonante, para não dizer chocante.

Apesar do impactante prólogo nos deixar tensos aos novos perigos que acometerão a pequena Hawkins, é a primeira sequência na cabana do Xerife Jim Hopper (David Harbour), que se abre no ainda inocente relacionamento entre Mike (Finn Wolfhard) e Eleven (Millie Bobby Brown), cuja química descrita desde o episódio piloto aumentou exponencialmente.

Logo de cara, temos uma subtrama que deve reger grande parte dos personagens: o amadurecimento. Afinal, Hopper lida, querendo ou não, com o fato de sua filha por consideração já ser uma adolescente e começar a desenvolver um gosto que não o inclui. Por outro lado, Eleven, com todo o seu poder, continua aprendendo de modo doloroso que nem tudo são flores e que até as pessoas aparentemente mais perfeitas (vulgo Mike, em sua concepção), podem cometer atos que nos magoem. O roteiro busca explorar esse breve pano de fundo cotidiano, trazendo-nos de volta ao mundo real ao mesmo tempo que volta a se respaldar nos tradicionais coming-of-ages de época que tanto marcaram a infância de muitos.

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Os laços de amizade também são colocados em xeque e giram em torno principalmente de Dustin (Gaten Matarazzo) e Will (Noah Schnapp). Dustin ficou um mês fora, conheceu uma garota chamada Suzie, e mal pode ver a hora de retornar para as várias aventuras ao lado de seus amigos – mas é recebido com pouca cerimônia e acaba se aproximando ainda mais de Steve (Joe Keery); Will, entretanto, cai numa cruel realidade e percebe que o que tinha com o restante de seu grupo não existe mais: enquanto os outros seguiram em frente e deixaram-se levar pela ordem natural das coisas, ele teve que lutar contra uma força demoníaca que queria possuí-lo e, logo depois, enfrentou as consequências terríveis de seu iminente sequestro. Agora, ele tenta recuperar o que deixou de ser realidade e agoniza em uma arrepiante e explosiva performance.

Entretanto, não é apenas o lado dramático que ganha força. A comédia também é canalizada pelas sutis brechas que se aglutinam tanto com a tragédia quanto as investidas do sci-fi que, sem sombra de dúvida, são as que nos mantêm vidrados até os segundos finais. Ao esquadrinhar a saturada relação comunista-capitalista que permeou a década em questão, os Duffer encontram algumas camadas novas e deliciosamente bem estruturadas. Qual é nossa surpresa quando dois coadjuvantes unem dois extremos e ajudam a fornecer um pouco mais de base para a arquitrama protagonizada por Hopper e Joyce (Winona Ryder).

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Numa perspectiva geral, temos três quatro arcos que poderiam ceder às ruínas do comodismo ou da zona de conforto. De um lado, Hopper e Joyce continuando construindo seu tóxico relacionamento que, eventualmente, nos arranca algumas risadas; Mike e Lucas (Caleb McLaughlin) entram em conflito com Eleven e Max (Sadie Sink), enquanto tentam permanecer próximos a um conturbado Will; Dustin, afastando-se dos outros, se junta a Steve, a Robin (Maya Hawke) e Erica (Priah Ferguson) em uma missão de decodificação de planos russos que, de novo, se infiltraram na pequena cidade; e, no final das contas, o Devorador de Mentes retorna para desencadear um reino de caos – porém, longe de tudo que poderíamos imaginar.

A criatura está mais forte do que nunca e abre espaço para que os showrunners usem e abusem de diversos artifícios narrativos em função de uma honrável melhoria na qualidade da série. É claro que o pano de fundo gira em torno do monstro, da figura desconhecida que habita os pesadelos de todos nós e que ganha vida nos momentos de pura tensão e desesperança – chegando até mesmo a dizimar vários habitantes de Hawkins. Todavia, ela também insurge como força-motriz de um segundo tipo de amadurecimento, um obrigatório que não pensa duas vezes antes de ser resultado de sacrifícios bem-vindos e necessários. É a partir daí que dizemos adeus a diversos personagens e percebemos de que forma tudo isso contribui para o comovente season finale.

Os Irmãos Duffer encontram espaço suficiente para entrelaçar gêneros opostos entre si, ainda que sejam em breves pinceladas. O drama e a ação carregam consigo uma expressiva voz e contrastam com uma fluida comicidade e um cientificismo que, apesar de se firmar numa pressa desnecessária, é, em maior parte, didático. Nessa atemporal mixtape, as escolhas artísticas são meticulosamente arquitetadas – até mesmo a instigante trilha sonora que oscila das memoráveis canções de Madonna até a trilha sonora de “A História sem Fim (1984).

A terceira temporada de Stranger Things representa uma incrível melhora na série e, como é de se esperar, nos acomete com um gancho para o próximo ano que já cultiva expectativas interessantes. E talvez a melhor parte seja o resgate do sentimento que a estreia do show nos causou – e que esperamos continuar para as novas iterações.

Escrito por Equipe Proibido Ler

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