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O Lar das Crianças Peculiares (2016) | A paixão de Tim Burton em contar uma história

Talvez em seus últimos filmes como Grandes Olhos (2014) e a animação Frankenweenie (2012), Tim Burton não tenha apresentado em tela o primor de sua genialidade. É notório essa percepção ao assistir O Lar das Crianças Peculiares. Burton sempre foi um cara que transportava tudo aquilo que ficava preso em seu subconsciente para as telas de cinema, nunca foi fácil entender o que se passa dentro da cabeça do cineasta, mas é possível dizer com toda certeza, que de alguma forma você compreende tudo isso e acha essa sutileza e genialidade em contar histórias muito agradável.

Em O Lar das Crianças Peculiares, Burton retoma aquilo que de melhor soube fazer em todos esses anos de carreira. Ele transformou um livro de sucesso “O Orfanato da Srta. Peregrine Para Crianças Peculiares“, de Ransom Riggs, em um ótimo filme mesmo com todas as “licenças poéticas” observadas durante pouco mais de 120 minutos.

A história é contada através do jovem Jake (Asa Buterfield), que é bastante apegado ao avô que sempre contou histórias das crianças peculiares que vivem com a Srta. Peregrine desde quando ele era pequeno. Mas misteriosamente o seu avô, Abe (Terence Stamp), morre tornando a vida de Jake ainda mais dura do que já era. Na busca de entender o que aconteceu com seu avô, Jake encontra uma série de pistas que levam até uma ilha do País de Gales, onde ele encontra o lugar que o avô morou durante a Segunda Guerra Mundial.

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Chegando ao local, ele encontra apenas ruínas do orfanato que foi bombardeado em 1943 e todas as crianças que viviam ali morreram. Mas algo lhe diz que existe um segredo dentro desse lugar, seu avô não estaria louco de inventar todas aquelas histórias do nada, portanto Jake passa a explorar o orfanato e descobre uma fenda atemporal que leva até o ano de 1943. Neste lugar, ele finalmente encontra a luminosa Srta. Peregrini (Eva Green), uma garota chamada Emma (Ella Purnell) que precisa usar botas de chumbo para não sair voando por ai, Claire (Raffiella Chapman) uma garota de aparência inofensiva, mas que tem uma força sobre-humana, Olive (Lauren McCrostie) a piromântica, um garoto invisível e os gêmeos que têm um poder misterioso que só é revelado em um momento crucial do filme. Jake vai se encantar com esse universo, porém terá que se unir às crianças peculiares para acabar com os Etéreos. Os vilões que tentam extinguir todas as fendas atemporais e assim, destruir de uma vez por todas a linha de tempo onde vivem a Srta. Peregrine e suas crianças peculiares.

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O longa tem um ritmo diferente, muito mais focado em contar uma história sem atropelar os fatos do que em encher o espectador de informações tão rápidas que deixam você com mais dúvidas do que certezas. É importante salientar, que o ritmo é pautado pelas descobertas de Jake, afinal de contas a história é contada sob a sua perspectiva. A partir do momento que ele vai descobrindo as coisas, o espectador segue junto na mesma toada. Algumas pontas soltas que ficam pelo meio do caminho, Burton consegue fechá-las posteriormente. Um exemplo disso, é o que ele faz para mostrar a peculiaridade do garoto que, na sua cabeça, parece que viveu sempre na ilha galês desde os tempos de Abe.

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Asa Buterfield está em seu 10º trabalho para o cinema, talvez a sua maior contribuição até agora seja em “A Invenção de Hugo Cabret (2011)”. Já em O Lar das Crianças Peculiares, Asa faz uma atuação mediana, percebe-se que falta alguma coisa ou que poderia ter ido além, mas é preciso entender se o personagem exigia mais do que foi apresentado. O universo criado por Tim Burton também não ajuda tanto, ainda mais se tratando de alguém que não chamou tanta atenção em seus últimos trabalhos. Que é diferente de comparar com a Eva Green, por exemplo, que já tem uma carreira consolidada, além de uma segurança tremenda em tela. A atuação de Asa deixa a desejar? Não, ela cumpre o seu papel em tela, porém não é àquela atuação que você fala “nooooosssa que foooda”, é bem ok para falar a verdade.

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Ella Purnell como Emma está tão leve quanto a peculiaridade de seu personagem. Quem assistiu a garota em Wildlike: Coração Selvagem (2014), sabe do que ela é capaz. Suas expressões são distintas e sua atuação está tão luminosa quanto a de Eva Green. Purnell conseguiu dar outra cara para as cenas que desenrola com Asa, apesar de todo o tom cinza, macabro e alegórico do longa, é possível enxergar cor e luz nos momentos que ela está por perto.

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Eva Green como a Srta. Peregrini não tem como dizer outra coisa se não luminosa, né? Logo na primeira cena onde ela abre a porta do orfanato para Jake, você percebe o ganho de luz na cena e no filme como um todo. Acho que depois de Winona Ryder e Helena Bonham Carter, a nova queridinha de Burton é a dona Eva.

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Samuel L. Jackson fecha a conta como o vilão canastrão. E como eu adoro vilões com esse tipo de índole. Além de ser 1000 vezes mais aterrorizante, deixa o filme divertido. Em Kingsman: Serviço Secreto (2014), ele já tinha mostrado que se dava bem interpretando um vilão, porém o que incomodou foi a mesma língua presa que ele deu vida a Richmond Valentine, que também está presenta na interpretação  do Etério Barron, De resto, ele está muito bem em tela.

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Sobre o roteiro, é sempre aquela coisa, né? Precisa estar bem atento em separar as duas mídias (livro e filme) para poder analisar o que se vê com parcimônia. Não dá para dizer que um filme adaptado de um livro é melhor que ele próprio, mas dá para analisar as duas coisas em separado. Portanto, existem divergências de adaptação, a que mais se fala é da troca do interesse romântico de Jake da piromântica para a menina que voa ou melhor, flutua. Também se fala na rapidez característica de apresentar os personagens ou a peculiaridade de cada um. Mas garanto que quem não leu o livro não vai se incomodar com nada disso. Apesar de desenrolar uma história com um ritmo diferente, Burton consegue amarrar as pontas soltas para deixar o espectador ciente das motivações de cada elemento apresentado. Talvez seu único problema aqui, seja em deixar claro para qual publico ele tenta conversar durante o filme todo. Se ele é um filme para criança ou para adulto, se ele tenta caminhar para o infanto-juvenil ou não, pois tem hora que o filme fica sério demais, em outro momento ele ri de si mesmo, nas cenas de ações ele chega a ser divertido e empolgante, mas tudo isso ainda com a sombra de suas alegorias ao fundo, com o lado claro de enxergar cores no escuro, com a forma de deixar algo macabro sem pesar a mão para o sangue e a violência, enfim é o jeito Tim Burton de ser, e não podemos dizer que ele foi sempre assim, pois cada filme seu, exibe um pouco daquilo que fica guardado em seu subconsciente.

O diretor de fotografia francês, Bruno Delbonnel, dirigiu a fotografia dos dois últimos longas de Burton: “Grandes Olhos e Sombras da Noite (2012)”, ele dirigiu também Harry Potter e o Enigma do Príncipe (2009). Portanto, é um cara que conviveu com o cineasta e consegue empregar em tela o grande estilo de Burton e isso, ele fez muito bem feito.

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O Lar das Crianças Peculiares é um filme rico em suas nuances, Burton está de volta com o melhor do que sabe fazer, que é contar belas histórias sob o seu ponto de vista um tanto peculiar. Muitos podem chamar esse filme de X-Men com Harry Potter, muitos podem dizer que a carreira de Burton está em declínio, mas garanto que se você prestar atenção em cada detalhe, em cada frame, em cada aspecto ou artificio que o diretor usou para dar vida ao lar da Srta. Peregrine, você vai perceber o quanto este filme se aproxima de suas maiores obras. Burton sempre foi um cara que soube contar uma bela história com muita paixão, mesmo que de forma complexa e cheio de escuridão, mas mesmo assim, ele encontra luz onde muitos de nós categoricamente dizemos que não tem.

Escrito por Bruno Fonseca

Fundador e editor-chefe do PL. Jornalista apaixonado por quadrinhos, filmes, games e séries.

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