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Dance of Days | 15 anos vivendo a dança dos dias

Formada em 1997 por Fábio Altro, ou só Nenê Altro, a banda de rock Dance Of Days, com mais de duas décadas de quilômetros rodados, é a última que ainda me move e me desperta sensações de alguma forma.

O primeiro contato foi em 2003, eu estava no terceiro ano do colégio (era assim que se chamava o ensino fundamental na época) e uma amiga do primeiro ano trazia em seu fichário um CD chamado “A História Não Tem Fim”. Achei o nome estranho,  o som logo de cara pior ainda, porém eu não sei o que aconteceu, pois músicas como Se Essas Paredes Falassem e Balada de um Corcel Verde Velho, não saiam da minha cabeça.

Eu ficava me perguntando como era possível gostar de uma musica com um vocal desses? Tão desafinado, tão estranho, tão, tão… Mas era na letra que estava a resposta. Eu ouvia porque aquelas palavras de certa forma mexiam comigo, mas depois me acostumei com o timbre, com a entonação e passei a achar aquela voz única.

Nascia ali um amor, pequeno, de forma estranha e até mesmo descabida por causa do tipo de música que eu ouvia na época. Se eu contasse para os meus amigos o que eu passaria a ouvir a partir dali, seria uma afronta. Tudo mudou e continua mudando até hoje. Faz parte do ser humano a busca pela evolução, mas certas coisas chegam e ficam independente do que aconteça. Elas apenas permanecem e como uma fibrose envolve qualquer “corpo” que você esteja vivendo no momento.

Dois anos depois, no marcante ano de 2005, com o EMO na explosão de seu auge, eu me libertaria na segunda edição do ABC Pro HC. Foi ali, em São Bernardo do Campo, em um sábado que eu nem me lembro a data, que eu tive a oportunidade de assistir ao primeiro show do Dance of Days. Decidi que a partir dali, eu iria em todos os shows possíveis e que seria a banda que eu acompanharia para o resto da minha vida. Passei a consumir tudo que eles faziam, acompanhava o Nenê no Fotolog, baixei a discografia inteirinha pelo Emule, e cantei o Valsa das Águas Vivas como ninguém.

2005 marcava também o começo dos MP3 players, e todos os 64 MB do meu Motorola Rokr se resumia em Dance of Days e outras bandas como Fresno, Gloria e Nx Zero. Este ano foi tão mágico, que talvez tenha sido o último momento em que o rock tenha marcado uma geração inteira. Posso estar falando bobagem? Sim, mas o EMO foi a última vertente que transformou pessoas, mentes e comportamentos. O Dance of Days surfou muito bem nesse momento e aproveitou como podia para se consolidar.

Com a chegada do Lírio aos Anjos, quarto álbum da banda além do Six First Hits (1997), eu ampliava a importância que ela passaria a ter em minha vida. Passei também a ler as coisas que o Nenê escrevia como o livro de poesias “Os Funerais do Coelho Branco” e o jornal Antimidia que era distribuído principalmente na galeria do rock. Nenê Altro se tornou uma espécie de ídolo e, por causa dele, eu passei a escrever poesias entre uma ligação e outra que eu atendia numa central de telemarketing onde trabalhava. Passei a conhecer obras de autores citados nas letras da banda como Franz Kafka e Gabriel García Márquez, além dos fragmentos de Interlúdio para um Bar de Estrada por 33 Anos Fora do Mapa que figuraram por anos o subnick do meu MSN.

“Então que se foda amor, que se foda. Se a palavra suja não rima, que se foda amor, que se foda. Pecado é não viver a vida”

Lírios aos Anjos marcou, marcou meu amor pelo Dance of Days, marcou o melhor show que eu vi deles na Outs – que fica no umbral da Rua Augusta -, marcou também o inicio de uma das fases mais sombrias do Nenê Altro. Todo mundo um dia se desvia do caminho, em alguém tão intenso quanto ele não seria diferente. Já dizia J.R.R Tolkien: nem todos os que se desviam estão perdidos. Pois bem, ele não estava! 2005 foi intenso pra todo mundo como foi pra ele também. O importante é que foi também o ano de incontáveis shows no saudoso Hangar 110, Cerveja Azul e Volcana.

Dance of Days era a banda que me fazia ficar até o final de um festival, que às vezes me fazia esperar até as 5 horas da manhã do outro dia para conseguir pegar um ônibus e voltar pra casa. Eu participei de várias gravações do DVD Metrópoles em Chamas, das primeiras maratonas de tocar todos os discos no Hangar 110 e do primeiro mosh pit que eu dei na vida ao tocar “Pregos Cruzes e Um Saco de Moedas” – na gravação do Canções Proibidas com a chegada do Insônia em 2008. Mas foi logo depois dele, que eu acabei me desprendendo da cena e percorrendo outros caminhos.

Como eu disse lá no começo, estamos em constante evolução, porém onde fincamos raízes, elas florescem e permanecem – o Dance of Days permaneceu! Talvez numa escala menor, mas permaneceu!  Eu colava em um show ou outro sempre que podia, revisitava um álbum ou outro de vez em quando, mas mesmo de “longe” eu acompanhava a trajetória do grupo de alguma forma.

Em 2014, eu estava no último ano da faculdade de jornalismo e a banda viraria meu projeto de TCC.  Junto com o amigo e também jornalista, Arthur Tomé, contar a história da banda em vídeo seria nosso objetivo. Foi a primeira vez que eu me aproximei de outra forma com todos os integrantes do DOD. Quem curte Hardcore e quem acompanha a cena, sabe muito bem que nela todo mundo é igual.

O cara vai ao show e fica no mesmo lugar que você, bebe a mesma cerveja que você, sobe ao palco toca o seu som e depois volta para o mesmo lugar. Não tem área VIP, não tem camarote, é todo mundo igual e com o mesmo objetivo de curtir e fortalecer o cenário. Sempre será assim. Mas quando chegou a fase da primeira tentativa de fazer um TCC (eu tentei umas 3 vezes e acabei me formando só em 2018), percebi que o contato que teria com eles a partir dali seria diferente. Mas por um problema meu de acumular cinco dependências, tive que parar o semestre e passar em todas elas até poder seguir em frente. Fazendo com que o projeto fosse para o buraco e que o Arthur fizesse o trampo com outra banda.

Trecho de “A Vitoria Ou A Coisa Que O Valha” do álbum A Valsa Das Águas Vivas (2004)

Independente de tudo isso e de todos os contratempos, eu segui em frente e a banda também. Nesse tempo, rolaram várias coisas, entre elas o incêndio na casa Moxei, onde era a casa do Nenê junto com o pessoal do Rancore e acontecia várias intervenções culturais e shows, teve o famigerado hiato que deixou muita gente triste e desesperada em eternizar “últimos momentos” do grupo. Enfim, aconteceu coisa pra caralho nesse meio tempo. Ninguém sabia como seria o dia de amanhã, o que seria do futuro, até que seis meses depois do “fim”, tudo voltou de um outro jeito, com uma nova formação e com novos objetivos.

Foi nessa época que eu tive uma das minhas maiores surpresas e, claro, o reconhecimento do trabalho que vinha fazendo como jornalista. Certo dia, voltando da Comix (loja de quadrinhos que fica na região da Paulista/Consolação), recebo no inbox da página do PL, uma mensagem do Nenê me chamando para trocar uma ideia. Conversamos sobre várias coisas, e ai surgiu a oportunidade de entrevistá-lo pela primeira vez, falar do Dance, de esclarecer tudo que rolou no hiato, e também de falar de mais um trampo solo dele, o Classe de 1972. A entrevista foi publicada no Red Bull Music e pode ser lida na íntegra AQUI.

Ali, a minha relação com a banda e principalmente com o Nenê Altro, caminhou para um patamar que eu jamais havia imaginado. Eu realizei um sonho de poder trocar ideia com ele de um jeito que eu sempre quis, arrumei a cagada de ter pegado DP na época do TCC e, ainda por cima, a persona que ele sempre foi pra mim, deixou de ter o status de ídolo e passou a ter o de amigo. Um tempo depois, a banda finalmente assinou com uma gravadora depois de uma longa jornada, seu comportamento mudou, aumentando a sua credibilidade e mostrando que a força que o Dance of Days sempre teve no underground nunca mudará.

Nenê Altro acabou se tornando uma outra pessoa, sua crença o ajudou a se encontrar, a se equilibrar e principalmente a acalmar os seus “demônios”. Ele reconquistou aquilo que havia perdido como pessoa, e passou a lutar para levar o nome do Dance of Days cada vez mais longe. Nas mãos do Digão da Musikorama Music Records/Universal Music Brasil, o DOD ganhou o que talvez tenha faltado em todos esses anos: um lugar mais calmo dentro da luta que sempre travou na cena independente.

Hoje eu vejo uma outra banda, enxergo que a dança dos dias é ainda mais constante, sua intensidade e movimentos são cíclicos e que a sua alma transborda o amor que toca mente, corpo e alma de um jeito único. Ela pode ser cafona como rimar amor para uma rádio AM, mas pode ser tão explosiva quanto um carro bomba.

“E quando for rimar amor, vou ser cafona. E quando for rimar amor vai ser pra rádio AM, que não tem vergonha de amar”

Go Dance, Go!

Escrito por Bruno Fonseca

Fundador e editor-chefe do PL. Jornalista apaixonado por quadrinhos, filmes, games e séries.

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