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Os 8 Odiados (2016) | Tédio com “T” de Tarantino

Quentin Tarantino chegou ao seu oitavo filme, ele dirige e assina o roteiro de “Os 8 Odiados“. O cineasta apresenta um western diferente de “Django Livre”, seu último filme, lançado em 2012. Aqui temos algo meio nostálgico e com muitas semelhanças ao filme que marcou o gênero “Tarantino” – Cães de Aluguel (1992).

Os 8 Odiados (The Hateful Eight) é ambientado alguns anos depois do fim da Guerra Civil americana na região de Wyoming, norte dos EUA, onde o frio no inverno é muito, mas muito intenso. Para fugir da forte nevasca que assola a região, um caçador de recompensas chamado John Ruth – O Carrasco (Kurt Russell) e sua prisioneira Daisy Domergue (Jennifer Jason Leigh) estão em uma diligência guiada por O.B. Jackson (James Parks) com destino a cidade de Red Rock, onde a assassina confessa e condenada seria vendida por 10 mil dólares. Em determinada parte do caminho, eles encontram o também caçador de recompensas Major Marquis Warren (Samuel L. Jackson) e um forasteiro que se diz o novo xerife da cidade, Chris Mannix (Walton Goggins).

Em meio à tempestade de neve, o Major Marquis e o sulista Mannix convencem John Ruth a lhes dar uma carona até a cidade destino de todos – Red Rock. Porém a tempestade fica muito forte, obrigando o grupo a suspender a diligência e buscar refúgio no único local que os mesmos tiveram tempo de chegar, o Armazém da Minnie. Neste lugar, eles vão encontrar outras quatros pessoas: o carrasco Oswaldo Mobray (Tim Roth), o cowboy Joe Gage (Michael Madsen), o general confederado Sanford Smithers (Bruce Dern) e o mexicano Bob (Demián Bichir). A partir daí, estão concentrados em um só lugar Os 8 Odiados” de Tarantino.

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A história é dividida em 6 capítulos e contada com tempo de sobra, afinal de contas, o longa tem 2:48min de duração e, dependendo da versão, pode até passar de três horas. É aqui que mora o maior problema deste filme. Ele é muito longo, arrastado e cansativo. Os 8 Odiados tem somente duas locações: a neve e o armazém. Como a neve é utilizada para transição, restou para o armazém da querida Minnie ser o local onde vamos acompanhar – com muita paciência – o desenvolvimento de cada um dos personagens. É nele, também, que Tarantino nos apresenta todas as emoções, desconfianças, discussões, mistérios, reviravoltas recheadas de suspense, violência exacerbada e sangue exagerado – algo pitoresco, mas que serve de marca registrada para seus filmes.

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Apesar de ótimos diálogos, dos monólogos interessantes que somente Samuel L. Jackson é capaz de protagonizar, dos momentos cômicos vividos por Walton Goggins, da bela interpretação de Kurt Russel e de todo o elenco de uma forma geral, o filme poderia ser mais dinâmico. A película se arrasta demais e chega, sinceramente, a dar sono. Uma coisa que eu odeio bastante é ver gente checando as notificações do celular dentro da sala de cinema, mas confesso que essa foi a minha vontade durante a transição do segundo para o terceiro ato. Quem está acostumado com a dinâmica de Kill Bill, Bastardos Inglórios e até de Django Livre, vai achar que o filme está descendo a Imigrantes ou a Anchieta em véspera de reveillon ou de um feriado prolongado.

O longa só se tornará interessante do 3º ato em diante. Por outro lado, é possível enxergar a verossimilhança com o filme que Tarantino dirigiu e escreveu em 1992 e que tem um mote parecido, que é Cães de Aluguel – um bando de ladrões presos em um local fechado, onde ninguém conhece ninguém e que estão lá por causa de um roubo de diamantes. Aqui, no caso, o próprio Tarantino em entrevista dada a jornalistas brasileiros quando veio promover o filme, disse que Os 8 Odiados é uma espécie de “Cães de Aluguel no velho oeste”.

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Pois bem, se você é um grande fã do cineasta, conhece seus oito filmes de cabo a rabo e também o seu jeito de conduzir um roteiro desta complexidade e natureza, não vai se incomodar com a lentidão. Eu tenho uma vaga lembrança de Cães de Aluguel, pois não consegui assistir até o final e isso provavelmente foi por volta de 2005/2006  – quando eu cheguei a estudar um semestre de cinema, que fazia parte da grade curricular da primeira faculdade que eu fiz (Gestão em Rádio e TV). Dali em diante, tive contato com alguns filmes do Tarantino e também aqueles que tiveram sua participação de alguma forma, seja como produtor, ator, roteirista ou afins. Talvez seja por isso que eu  tenha achado o filme tedioso. Ou não compreendi a perfeição e grandiosidade que passava pelos meus olhos por falta de sabedoria.

A fotografia do filme é sensacional. Ficar em um ambiente fechado e ter que trabalhar a luminosidade para dar um ar de suspense e mistério dentro de uma cabana ficou muito bom. Sem falar que as cenas tiveram que ser gravadas em um ambiente escuro, pois estava de noite e ainda com uma forte nevasca. A fotografia foi essencial para dar a cara de western que o filme precisava, sem a necessidade de ter o deserto como plano de fundo.

A edição e montagem pode ter atrapalhado um pouco e contribuído para o filme ter ficado tedioso, mas em contrapartida, os efeitos especiais supervisionados por Greg Nicotero (The Walking Dead), velho parceiro de Tarantino, estão sensacionais. Principalmente quando é necessário empregar uma quantidade de sangue generosa e gore jamais vista em seus outros filmes.

O toque de Enio Morricone na trilha sonora é primoroso. Em dado momento você refletirá se o que está assistindo é um filme de velho oeste ou de terror.

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O elenco deste filme está fora de série e os maiores pontos positivos vão para Samuel L. Jackson e seu protagonismo fantástico. Ele, e somente ele, consegue dar vida e entonação totalmente diferentes aos diálogos quando está num filme do Tarantino.

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Channing Tatum também está muito bem. É ótimo ver um ator que você questionava o talento e trabalho na indústria fazer você tirar a pulga atrás da orelha. Depois de “Foxcatcher – Uma História que Chocou o Mundo”, “Magic Mike XXL” e sua breve (ele demorou tanto para aparecer que achei que ele estava na produção do filme e não atuando) participação em Os 8 Odiados, eu passei a admirar o seu trabalho de um jeito que não fazia antes. A culpa por eu passar um bom tempo odiando o Channing é de uma adaptação do Nicholas Sparks, mas isso é papo para outra hora.

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Jennifer Jason Leigh está deslumbrante e eu nunca vi uma mulher tão forte, tão sagaz e tão resistente como ela esteve neste filme. Em contrapartida, nunca vi uma personagem apanhar tanto de forma gratuita. Tarantino foi chamado de machista pela crítica americana, acusado de usar a violência de forma gratuita contra a personagem de Jason Leigh, Daisy Domergue, como uma forma de entretenimento. Durante a coletiva que ele deu, foi levantada essa questão e o cineasta se defendeu dizendo:

“Ela sofre bastante ao longo do filme, é verdade, mas pra mim ela é a personagem mais perigosa naquela cabana”.

Confesso que me senti incomodado por isso. Nenhum dos oito odiados sofre tanto quanto ela, apesar do final brutal que muitos podem ter, enxerguei na violência para com a sua personagem exatamente o que a crítica americana estava apontando. Algo totalmente desproporcional para a trama e, de certa forma, um pouco desnecessário também. Mas, sim, eu tenho conhecimento de que esse é o Tarantino e o simples fato de eu me sentir chocado pelas cenas de violência, prova que a intenção do cineasta me acertou em cheio.

Os 8 Odiados pode levantar uma série de questões políticas, históricas, raciais, comportamentais e na forma como se enxerga o preconceito num cenário como aquele por onde o enredo transcorre, mas ainda é um filme que parece muito ser a visão que Tarantino tem do mundo que é só dele. Ou simplesmente uma fanfic que ele deve ter guardado em sua cabeça que permeia a genialidade e a insanidade doentia guardadas no seu infinito particular. Os 8 Odiados carrega como pano de fundo a morosidade e a falta de dinâmica num tédio com T de Tarantino, que tem em seus diálogos excepcionais, na violência gratuita e na quantidade de sangue, o suprassumo de sua sabedoria.


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Escrito por Bruno Fonseca

Fundador e editor-chefe do PL. Jornalista apaixonado por quadrinhos, filmes, games e séries.

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