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O Show de Truman – O Show da Vida (1998) | Uma sombra na minha vida durante décadas

A história de como o filme estrelado por Jim Carrey mexeu comigo por anos sem eu perceber

Eu fui uma criança apaixonada por desenhos, filmes e seriados. Comecei com os tokusatsu da Rede Manchete e desenhos que passavam na Globo e SBT. Quando meu pai teve a oportunidade de comprar um videocassete, eu ficava dias assistindo aos mesmos quatro filmes que ele tinha colocado numa VHS da Basf. 

Eu tinha apenas 12 anos e  morava na periferia da zona leste de São Paulo. As ruas eram de terra e nem tinha esgoto encanado, o acesso à informação era difícil e à cultura também, as opções de lazer consistiam nas aulas de educação física na escola (que foi considerada pelo SPTV uma das mais violentas de SP uma vez), e nas brincadeiras de rua com os colegas de infância.

Naquele tempo eu só conseguia assistir aos filmes da TV ou aqueles que meus pais alugavam. Em uma dessas fitas, pude assistir “Debi & Lóide” (1994), “O Máskara” (1994) e aos dois filmes de “Ace Ventura”. Ou seja, todos os filmes protagonizado por Jim Carrey e todos eles com os mesmos gêneros: comédia e aventura. 

O Show de Truman - O Show da Vida (1998) | Uma sombra na minha vida durante décadas
Cena do filme “Debi & Lóide” (1994)

Na minha cabeça, Jim Carrey só fazia filme de comédia e isso era a única coisa que eu sabia sobre ele. Se eu fosse em uma locadora e achasse um filme com o Jim Carrey na capa, certeza que seria um filme bom, que eu iria me divertir e dar muita risada. Minha receita era julgar o filme pela capa. Não havia internet e nem dinheiro para comprar jornal, eu nem sabia o que era isso, as bancas pra mim serviam pra duas coisas: gibis da “Turma da Mônica” e  “Revista Herói”.

Depois de um tempo, descobri que a Cinemark tinha aberto 14 salas em um shopping perto de casa. Era o Cinemark 14, do Interlar Aricanduva, que ainda existe (mas não com 14 salas) e fica no complexo do Shopping Aricanduva, na zona leste de São Paulo. 

Como eu era um jovem estudante, pagava meia e o valor do ingresso na época era R$ 2,00. Pra chegar ao shopping eu tinha que pegar uma lotação que na época era um transporte clandestino (hoje foi regularizado), e eles cobravam R$ 1,00 pela viagem feita em Kombis ou em Vans.

Meu pai sempre me dava R$ 5,00 para ir ao shopping dar um rolê e sabe o que eu fazia? Isso mesmo, torrava essa fortuna indo ao cinema. Então a conta era simples: 2 reais pro cinema, 2 reais de passagem e sobrava 1 real pra comer uma casquinha no méqui. Pipoca e refrigerante? Não faziam parte do meu vocabulário, mas eu dava meus pulo e na maioria das vezes conseguia encontrar um saquinho refil de pipoca da Cinemark largado pelo cinema. 

Certo dia, eu fui nesse esquema pro cinema e chegando lá dei de cara com um cartaz do Jim Carrey num grande telão em meio a uma rua muito movimentada e uma galera de platéia. Pensei: que sorte que eu dei, um filme do meu ator preferido está em cartaz e tem sessão próxima. Vou comprar! 

Modo Avião (2020) | O ‘Show de Truman’ da Larissa Manoela

O nome do filme era “O Show de Truman – O Show da Vida” (1998), não foi o primeiro que eu vi do astro no cinema, pois meu pai tinha me levado pra assistir ao “Ace Ventura 2 – Um Maluco na África” (1995) num outro cinema mais antigo. Truman foi o primeiro filme do Jim Carrey que eu assisti sozinho. 

Pensa: uma criança de 12 anos indo ao cinema sozinho e escolhendo um filme só por causa do ator? Ela não leu nada sobre, não leu a sinopse, só foi. Imagina a situação? 

O Show de Truman - O Show da Vida (1998) | Uma sombra na minha vida durante décadas

Cheguei na bilheteria e olhei pra moça e disse: quero um bilhete para esse filme aí do Jim Carrey. Ela perguntou se era “O Show de Truman”, disse que sim e logo em seguida percebi que ela ficou me julgando. 

Pô, o que demais teria num filme do Jim Carrey? O que de ruim poderia acontecer, né mesmo? Pra mim era mais um filme de comédia, e assim eu fui lindão para a sala de cinema. Naquela época, a gente nem sonhava com salas stadium, óculos 3D, poltrona que vira cama e coisas do tipo. As salas tinham uma leve inclinação para não ficar um cabeção na sua frente e a tela ficava lá no topo da parede. 

Eu ia tanto naquele cinema, que decorei todas as falas das propagandas que passavam antes do filme. 

O Show de Truman - O Show da Vida (1998) | Uma sombra na minha vida durante décadas
Bom dia, boa tarde, boa noite!

Quando o “O Show de Truman – O Show da Vida” começou, eu fiquei encantado com Truman Burbank (Jim Carrey). Já nas primeiras cenas, têm umas gracinhas dele dando bom dia, boa tarde ou boa noite pro vizinho e pensei: alá começou a comédia o cara é foda. Mas eu fui caindo do cavalo aos pouquinhos. Meia hora de filme e nada do Truman me fazer rir. Uma hora de filme e Truman estava me deixando angustiado. Uma hora e meia de filme e cadê a comédia dessa porra?

Uma hora e quarenta e três minutos de filme, e o Truman estava causando o meu primeiro trauma dentro de uma sala de cinema. Quando acabou, eu saí de lá perturbado, achando que todo mundo estava me vigiando, que eu vivia uma mentira chamado de vida e estava preso sem saber onde ficava a saída. Cadê as câmeras? Quem é o diretor? Qual é o roteiro? Quem tá manipulando essa merda? Enfim, esses foram ALGUNS questionamentos. 

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Peguei a lotação, gastei o último real que eu tinha guardado e fui pra casa boladão por não ter sido um filme de comédia. Mas contente por ter gostado dele mesmo assim, mas ao mesmo tempo ainda bolado por não ter entendido nada. E convenhamos, nem dava!

Porra Jim Carrey, tu só fazia comédia aí tu me pega e me faz um dramalhão desses? Porra! Eu era criança, bicho,  Endente? Eu nem sabia nada da vida (continuo não sabendo), só queria rir e você me fez chorar. Eu não estava entendo porque estava chorando, mas estava. 

O Show de Truman - O Show da Vida (1998) | Uma sombra na minha vida durante décadas
Sorria você está sendo filmado

Na manhã seguinte, contei que vi o filme pros meus colegas da escola e ninguém ligou. Lá ninguém ligava pra esse tipo de coisa. Então eu tive que conversar comigo mesmo e cheguei a conclusão que eu teria que esquece-lo pra continuar com um pouco de sanidade. 

Eu ainda assisti a outros filmes sem ler a sinopse ou obter qualquer informação prévia. O “Homem da Máscara de Ferro” (1998), por exemplo, foi um deles. Assisti por causa de “Titanic” (1997), eu amei o Jack Dawson. Por isso queria ver o Jack preso na masmorra de um castelo enquanto um usurpador muito parecido com ele ocupava seu lugar. Mas voltando pro Truman… 

Os anos passaram e nunca consegui esquecer esquece-lo. Portanto, eu decidi rever e refrescar a memória. Veja só que boa ideia, não é mesmo? Fui tentar compreender o que o Bruno de 12 anos tinha visto.

E porra, que filme denso para uma criança de 12 anos assistir. Ele é profundo em uma série de coisas, são tantas camadas (pareço até cinéfilo falando) que eu com aquela idade jamais teria capacidade de suprir. Acho que até hoje não foi consegui em sua totalidade. Mas ao assisti-lo, compreendi uma das mensagens. Esta cena foi crucial pra mim. Foi nela que eu percebi tudo. 

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O Show de Truman - O Show da Vida (1998) | Uma sombra na minha vida durante décadas
A cena mais impactante do filme

Consegui compreender que muito do que vivi tem relação com o mostrado no ‘show’ que Truman viveu. Principalmente a superficialidade dos relacionamentos profissionais, os ditos “amigos”, os sorrisos e as coisas artificiais. Eu preciso, preciso…

Truman pode não ter me ensinado nada aos 12, mas me ensinou hoje e eu vou encontrar a saída. Eu vou sair por aquela porta, o show vai acabar e uma nova vida vai começar.

Obrigado Truman por ser uma sombra em minha vida durante décadas e obrigado por me mostrar metaforicamente como seguir em frente. 

O Show de Truman - O Show da Vida (1998) | Uma sombra na minha vida durante décadas
Obrigado, Truman!

Abaixo, eu deixo o trailer do filme e pra quem quiser assistir, “O Show de Truman – O Show da Vida” (1998) está disponível apenas pra aluguel na Claro Vídeo, Prime Video, AppleTV e YouTube.

Escrito por Bruno Fonseca

Fundador e editor-chefe do PL. Jornalista apaixonado por quadrinhos, filmes, games e séries.

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