Diego Muntowyler Lembro até hoje da primeira vez que ouvi o nome do Rafael Grampá. Foi pela minha mãe, falando sobre a Comic Con de 2014, em que Grampá e Ivan Reis assinaram um poster oficial. Foi a primeira vez que tive contato com a arte dele e, como sempre gostei de desenhar, foi uma referência que se manteve presente desde então.
“É um artista brasileiro desenhando o Batman!”, minha mãe disse algo mais ou menos assim. E isso (na minha cabeça de 14 ou 15 anos na época) ficou comigo.
Já acompanhava fervorosamente os quadrinhos e já conhecia Ivan Reis e Mike Deodato Jr., ambos com trabalhos espetaculares. Mas ver um artista dessas terras desenhando oficialmente o Batman de forma tão autoral mexeu mais comigo do que poderia prever.
O traje azul e cinza, do qual até o momento não era muito fã, sendo trabalhado com sobreposições e parecendo ser realmente feito de peças combinadas. A sunga clássica por cima da calça sendo substituída por uma solução criativa que justifica o padrão de cores nessas regiões. O morcego desenhado como nunca visto antes – basicamente formado por triângulos. Realmente existe magia nesse Batman, e na época já tinha um interesse muito específico e que nutro até hoje: em design de personagens – na produção desse texto ainda constatei que ele e Rafael Albuquerque foram os primeiros brasileiros a trabalhar oficialmente no Batman, o que torna tudo ainda melhor.
Desde então, esbarrei com seus trampos aqui e ali. A primeira história que li com seu roteiro foi mais ou menos na mesma época, mas que foi lançada entre 2010 e 2011: MARVEL – STRANGE TALES II.
Uma história bem curta e centrada no Wolverine, personagem que Grampá diz ele mesmo ter escolhido trabalhar para trazer sua visão e que é bem curta, mas que explora bastante a violência atribuível ao personagem e que mostra uma perspectiva única e interessante sobre o fator de cura do mutante. Inclusive, seria uma boa pedida relê-la anos depois.
De lá pra cá, tive muitas idas e vindas com ilustração e leitura de quadrinhos. No último ano, esbarrei na primeira obra solo de Grampá na Livraria Cultura. Uma Graphic Novel lançada em 2008 e considerada melhor estreia pela revista norte-americana Wizard, republicada em 2010 pela Dark Horse: MESMO DELIVERY.
Não apenas as ilustrações, mas toda a lógica das cores chama a atenção em uma primeira olhada. E em uma segunda. E em uma terceira. Na verdade, do começo ao fim – ainda mais tratando-se de uma narrativa curta, lida em uma sentada enquanto estava na livraria com minha esposa – a história prende visualmente, sendo concisa e autossuficiente tanto em sua curta quantidade de páginas quanto em sua paleta de cores bastante reduzida – e imensamente eficaz.
Nos últimos tempos, Grampá tem trabalhado em diversos projetos interessantes – e que até então venho acompanhando com certa distância, mas seria bom tirar o atraso – como “Cavaleiros das Trevas: A Criança Dourada” (2019-2020), em que trabalhou com ninguém menos que Frank Miller e “BRZRKR”, ao lado de – também “ninguém menos” – que Keanu Reeves, em sua primeira HQ.
Em primeira mão, eu que nunca fui muito fã de cobertura de hard news – trago a novidade anunciada por Grampá em 14 de junho.
“BATMAN – GARGOYLE OF GOTHAM”, com roteiro e arte por ele mesmo e coloração de Matheus Lopes (que tem um trabalho incrível na indústria, vale conferir!)
O título sairá pelo título DC Black Label (voltado a histórias mais maduras e fora da continuidade), contando com quatro edições em setembro, aproveitando a data do dia do Batman.
Segundo Grampá:
[…] Quem ele é e como ele veio a ser…
Este foi o título da história que apresentou a origem do Batman em 1940, onde Bruce Wayne jurou vingança para os espíritos de seus pais assassinados e – motivado pela sua crença em presságios – se tornou o Batman. Pra mim, esse aspecto sutil do sistema de crenças de Bruce sempre foi fundamental para o Batman, e através dessa lente reconheci esta história nunca contada.
“Batman: Gargoyle of Gotham” explora “quem ele é e PORQUÊ ele veio a ser”. Isso torna meu sonho de trazer minha própria interpretação do Batman e sua origem de vida à realidade enquanto mergulho nos cantos escuros de sua essência, introduzindo uma galeria de vilões nova em folha e tecendo uma perspectiva diferente em Gotham City. […]
O selo ainda vai levar um tempo pra sair, mas particularmente foi o primeiro anúncio de um quadrinho de super-heróis em anos que me deu uma vontade genuína de acompanhar.
Acredito que o trabalho de Grampá valha a expectativa. Ele já provou entender o personagem de forma única, seja com suas releituras interessantíssimas ou em colaborações marcantes.
E, de forma bem pessoal, assumo bastante orgulho na relevância de um personagem tão querido sendo bem representado por um artista nacional de calibre. Por isso esse anúncio marca um reencontro com o relato que trouxe no início, sobre o poster da Comic Con. E espero ter te dado bons motivos para acompanhar um dos quadrinistas mais interessantes da atualidade e entender o porquê esse anúncio é tão impactante.
No fim, Gotham City também é nossa.
