Bruno Fonseca Vivíamos numa cultura de “spoiler” até a popularização das redes sociais. À medida que as pessoas têm acesso a informações disseminadas por milhares de usuários conectados, cada vez mais estamos sujeitos a saber coisas que não são agradáveis, entre elas, os spoilers. Sejam de seriados, filmes, novelas, desenhos, animes, histórias em quadrinhos, livros, lutas do UFC que não passam ao vivo na TV aberta, entre outros.
Contudo, antigamente não era assim. O Brasil sempre viveu numa cultura do “spoiler” – deixo em aspas, pois o nome dado para revelações do enredo de determinada obra era “fofoca”.
Eu me lembro que a propagação dos spoilers, até pouco tempo atrás, era disseminada no boca-a-boca. Quando não existiam lugares demarcados nas sessões de cinema e se formavam filas enormes para garantir um lugar melhor nas salas, sempre passava um cidadão que acabara de sair da sessão anterior comentando em voz alta todas as partes mais importantes do filme.
Lembro também que, quando estava numa dessas filas, esperando para assistir “X-Men 2”, um cara passou por mim dizendo para outro que a Jean Grey havia morrido. Foi chato, doeu, mas é totalmente diferente do que acontece hoje.
Quando digo que tínhamos uma “cultura do spoiler”, não estou mentindo. Basta passar por uma banca de jornal e ver quantas publicações com spoilers de novelas exibidas na TV aberta estampam sua fachada. Posso até citar o nome de algumas revistas que ainda estão no mercado e se sustentam na base do spoiler: Tititi, Minha Novela, Gente, Contigo!, Guia da TV, Viva!, entre outras. Talvez o fato delas existirem há mais de duas décadas, seja a prova que muita gente ainda alimenta esse tipo de cultura.
Com o advento da internet (adoro essa palavra) muita coisa mudou. Hoje, tomar um spoiler é bem diferente do que passar em frente a uma banca ou estar na fila do caixa de um supermercado, olhar para as gôndolas e ver a manchete de uma revista dizendo o que vai acontecer na novela das oito. Para tomar um spoiler hoje, basta checar a timeline do Twitter ou do Facebook. Eles estarão lá com toda certeza, ainda mais se o spoiler dado se tratar de uma série baseada nas “Crônicas de Gelo e Fogo”.
Dia 14 de junho de 2015, exatamente às 22h do horário de Brasília, foi ao ar o 10º episódio da quinta temporada de Game of Thrones. Em pouco mais de 1 hora, a HBO apresentou a adaptação que finalizava o último livro das Crônicas de Gelo e Fogo. Escrito por George R.R. Martin e chamado “A Dança dos Dragões”, o livro foi lançado em 12 de julho de 2011. Este episódio, sem dúvidas, deve ter sido o mais assistido da série até o momento, e com certeza será um dos mais pirateados também. Após sua exibição as redes sociais receberam uma enxurrada de posts sobre as cenas que muitos, assim como eu, tinham acabado de assistir.
O resultado disso foi muita reclamação sobre as revelações do enredo. É correto afirmar que ninguém é obrigado a assinar um pacote de TV à cabo e, muito menos, assistir ao episódio no momento em que ele é exibido mundialmente. Só que, se tratando de Game of Thrones, se você não quer tomar spoiler existem algumas opções:
• Ficar fora da internet até você ter a oportunidade de assistir o episódio.
• Assinar os canais da HBO mesmo que seja por alguns dias. Você pode cancelar junto a sua operadora a qualquer momento, uma vez que não existe fidelidade para melhoria de pacotes ou inclusão de canais no serviço de TV que você assina.
• Assistir via streaming nos sites que fornecem esse tipo de serviço.
• Ler o livro que, novamente afirmo, foi lançado há mais de 4 anos.
Eu mesmo fiz questão de assinar os canais e assistir a exibição oficial, justamente para evitar os spoilers que eu sabia que tomaria logo após às 23h. Inclusive tomei spoilers alguns anos atrás sobre as cenas finais deste episódio, através de algumas discussões sobre o seriado com amigos. Quando eu reclamei sobre o que eu tinha acabado de ouvir, um deles me disse: “O livro foi publicado há anos e você ainda não leu, ou seja, a culpa não é minha.”
Pois bem, o argumento é válido. Por mais que muitos não concordem, ele continua sendo válido. O fato é que hoje muita gente prefere reclamar de algo a fazer um esforço para evitar os incômodos. E muita das vezes nem se trata de um spoiler, mas como é algo que a pessoa não viu, qualquer coisa se torna “spoiler” na visão dela e isso para mim é a “Spoilerfobia”. Tudo bem se você não pode, não teve tempo, não tem tv à cabo, não sabe alugar na locadora torrent ou não tem internet, eu entendo tudo isso. Só não entendo o fato de você se sentir incomodado pelas pessoas que tiveram a chance de ver e comentaram. O sentimento é mais ou menos como a imagem abaixo:
A Spoilerfobia é um negócio chato e muita gente acaba reclamando por esporte. Me lembro de um caso onde o ator Michael Kelly, intérprete do personagem Doug Stamper, da série original da Netflix, House of Cards, teve que vir a público e fazer um comunicado em vídeo aos espectadores que reclamaram dos spoilers da terceira temporada da série. Ele falou o seguinte:
“Acho importante diferenciar o ‘spoiler babaca’ do ‘spoiler inevitável’. O primeiro tipo é quando alguém estraga por puro prazer. O segundo é quando você está tão desatualizado numa série que qualquer informação parece um spoiler.”
Ele destacou que, assim como o Titanic afundou, numa das cenas mais marcantes da produção de James Cameron, em House of cards, Frank Underwood agora é presidente. Para Michael Kelly, isso não pode ser considerado spoiler, já que “Você teve mais de um ano para saber disso”.
Se projetarmos isso para Game of Thrones, segue da mesma forma. Nós tivemos mais de 3 anos para saber o que aconteceria com cada um dos personagens no episódio final da quinta temporada da série, que corresponde ao quinto livro escrito por George R.R. Martin. E caso você não queira tomar spoilers nos casos onde a exibição é simultânea entre vários países, se programe ou se antecipe, assim você vai ver que o fato de você comentar sobre o que acabara de ver nas redes sociais, não faz você transmitir um spoiler por prazer (por mais que existam pessoas que fazem isso), mas sim, pelo simples fato de comentar um assunto do momento. Assim como muita gente faz quando está assistindo um programa de televisão, partida de futebol e etc, e aproveita para comentar e opinar o que está assistindo nas redes sociais.
Daqui alguns dias vão colocar alerta de spoilers em sinopses de livros, filmes, seriados ou coisa que o valha, justamente por esse tipo de atitude.
