in

Folclore e mitologia em Naruto | Bijuus

Se Akira Toriyama baseou-se quase que completamente em “Jornada Ao Oeste” quando criou Dragon Ball, Masashi Kishimoto, por sua vez, utilizou vários elementos mitológicos distintos – todos eles a partir da mitologia Xintoísta.

Este post – e talvez outros – visa trazer informações sobre suas referencias, com o intuito de fornecer mais dados sobre a franquia e sua complexidade oculta.

Este post contém Spoilers!

Antes, gostaria de explicar alguns pontos importantes para um melhor entendimento:

Youkais

Youkais costumeiramente são seres antropomórficos sobrenaturais animais ou ainda, representações humanas da natureza. O termo Youkai é ambíguo e vale para toda criatura sobrenatural nascida assim – O que é um pouco diferente dos Mononokes, que são espíritos nascidos a partir de sentimentos vingativos, estes por sua vez, podem ser equiparados a uma doença amaldiçoada, um câncer espiritual que atormenta por uma causa.

Assim como acontece em outras mitologias, no Xintoísmo também há mestiços com seres humanos, os Youkais mestiços recebem o nome de Hanyō.

Chakra

A união da energia espiritual com a física, e ainda mais importante do que isso: A energia da natureza.

As Bijuus, em Naruto, são bestas de chakra com caudas. São ao todo nove bestas e cada uma delas possui seu respectivo numero de caudas – o que é diretamente relacionado a sua força – e elas, por sua vez, são mantidas sob controle com o uso de Junchirukis – pessoas que são possuídas por estas bestas, tornando-as prisioneiras em seus corpos.

Mais para frente – isto é, lá pro final da série, descobrimos a relação entre todas estas Bijus. Na verdade, elas são o chacra da Dez-Caudas dividido em nove.

Bem, sem mais delongas, apresento em ordem crescente:

Uma-Cauda:  Shukaku (守鶴 – Guindaste Protetor – Saquê)

Os tanukis (cães-guaxinins), são animais travessos e alegres viciados em álcool, mulheres e comida. Mestres no disfarce e na troca de formas – principalmente em relação a objetos inanimados – são o arquétipo da pilantragem, chegando até a transformar folhas em dinheiro falso.

É comum serem retratados de chapéu, segurando uma garrafa de saquê e uma nota promissória que nunca é paga. Sentados em seus enormes testículos – sobre isso, há toda uma mitologia envolvida, que por sua vez foi ganhando ainda mais espaço a partir de artes bizarras que você pode conferir aqui.

Além da aparência, Shukaku, apesar de não ser exatamente um “bêbado pilantra”, é muito emotivo em seus atos, tal qual um Tanuki.

Algumas histórias referenciadas em Naruto:

Felicidade borbulhando como água em uma chaleira (Bunbuku Chagama)

Obs: Shukaku era contido em uma chaleira.

Um homem pobre salva um Tanuki preso em uma armadilha. Na mesma noite, o Tanuki aparece para ele, o agradecendo por sua bondade ele se transforma em uma chaleira e diz ao homem para vendê-lo e ficar com o dinheiro.

O homem vende o Tanuki transformado em chaleira para um monge, que o esfrega bem e o coloca no fogo para ferver água. Sem conseguir suportar o calor do fogo, o Tanuki transforma apenas suas pernas de volta e foge.

O Tanuki volta para o homem com uma nova ideia. O homem montaria um  mini-circo e cobraria ingressos para mostrar ao público pagante, uma chaleira andando na corda bamba. O plano funciona e os dois acabam criando ali, uma sociedade feliz – o tanuki ganha um amigo e moradia enquanto o homem consegue sustento com o espetáculo.

O portal de Kenchō-ji

Obs: Acreditava-se que Shukaku era o espiritio corrompido de um monge de Suna. Mais tarde descobrimos que um monge já foi seu Junchiruki e este, por sua vez, o ensinou os primeiros passos para a bondade.

Conta-se que um Tanuki, grato pela bondade dos monges do templo Kenchō-ji para com ele, se disfarçou de monge e coletou uma grande quantia de dinheiro para o templo. Até hoje o portão principal é chamado de “Portal do Tanuki” em sua honra.

Duas-Caudas: Matatabi (又旅 – Viaje novamente – Actinidia|Videira De Prata – Planta japonesa com o mesmo efeito da erva de gato)

O Bakeneko (gato monstro) é um gato comum que se torna um Youkai a partir de alguns critérios, são estes:

  • Quando atingem uma certa idade.
  • Se são presos por uma certa quantidade de anos.
  • Se crescem demais.
  • Se possuem uma cauda muito grande.

Neste último caso a cauda se divide em duas e o Bakeneko se transforma em Nekomata – uma versão bem mais poderosa deste – a quantidade de caudas nos Bakemonos (monstros animais) está relacionada também a idade: Quanto mais velho, mais caudas e mais sábio e poderoso.

Os Bakenekos gostam de andar sobre duas patas e possuem um relacionamento direto com os mortos – são capazes de reanimar cadáveres e transforma-los em marionetes ao seu bel prazer.

Capazes de conjurar tempestades e expelir fogo de suas bocas, os Bakenekos são retratados como gatos envoltos em chamas e, por isso, são associados a incêndios inexplicáveis.

Ao contrário dos Tanukis, os Bakenekos são extremamente vingativos e violentos e irão assombrar qualquer casa em que forem mantidos. Eles também podem se metamorfosear em pessoas e em alguns casos devoram os seus donos e vivem em seu lugar. Outra forma que os Bakenekos tomam é a de uma segunda lua no céu.

Apesar de vingativos e violentos, são extremamente leais.

Três-Caudas: Isobu (磯撫 – Colher, concha – Pancada De Praia – adaptado de Isonade 磯撫で)

O Isonade é um monstro marinho, parecido com um tubarão gigante e escamoso – escamas essas que funcionam como farpas metálicas afiadas –  que se esconde na costa de Matsuura e em outros locais ao Oeste do Japão.

A cauda do Isonade é como um gancho. Ele tem o costume de, furtivamente, tombar embarcações e devorar tripulantes. O bastão de Yagura, o penúltimo Junchiruki de Isobu, é enganchado da mesma forma.

Quatro-Caudas: Son Goku (孫悟空 – Rei Macaco)

Nascido de um pedra alimentada pelas forças do caos, Son Goku é um macaco insatisfeito que se tornou rei de todos os macacos e depois disso passou a peregrinar em busca da imortalidade.

Ensinado pelo imortal Budhi, Son recebe o poder das 72 transformações, o poder de saltar sobre as nuvens e o poder de transformar cada um dos pelos do seu corpo em cópias de si mesmo. Acabou sendo expulso da escola de Budhi por se vangloriar o tempo todo.

É orgulhoso, arrogante, brincalhão, não leva desaforo para casa e não aceita um não como resposta. Ao ponto de se autoproclamar deus quando os deuses lhe dão o posto de cuidador de cavalos e enfrenta-los pelo seu reconhecimento.

Em sua rebelião contra os deuses, Son foi preso em um caldeirão de oito trigramas para ser destilado dentro de um elixir. Quando o caldeirão foi aberto, Son saltou do mesmo bem mais forte do que antes e com um olho que conseguiria reconhecer o mal em qualquer forma. O que lembra a forma como Naruto e Son se conhecem e como Son o julga bem.

Após idas e vindas, Son acaba partindo em uma jornada com um monge budista contra a sua vontade, em busca de escrituras sagradas. Nessa jornada Son recebe um diadema que o obriga a obedecê-lo.

Kishimoto baseou-se tanto em “Jornada Ao Oeste” quanto em Dragon Ball para a criação de Son Goku, tanto que seu design é baseado no Oozaru e o Junchiruki Rōshi recebe o mesmo nome do Mestre Kame.

Veja também: Dragon Ball | Tudo sobre a lenda que deu origem à série

Cinco-Caudas: Kokuo (穆王 – Rei respeitoso/Mu – ‘穆 Densidade)

Mu foi o quinto rei da dinastia chinesa Zhou. Há um conto que diz que Mu sonhou uma aventura com seu bravo cocheiro Zaofu, onde ele buscava encontrar os céus e saborear os pêssegos da imortalidade.

Há ainda um conto onde um artesão apresenta ao rei Mu uma cópia mecânica deste. O rei, vendo que a maquina era melhor do que o homem, fica irado e desmonta sua cópia com satisfação:

“O rei olhou para a figura com espanto. Ele caminhou com passos rápidos, movendo a cabeça para cima e para baixo, de modo que qualquer um o teria tomado por um ser humano vivente. O artesão tocou seu queixo, e começou a cantar, perfeitamente em sintonia.

Ele tocou sua mão, e começou a gesticular, mantendo o tempo perfeito… À medida que a performance estava chegando ao fim, o robô piscou o olho e cortejou as damas presentes, após o que o rei indignou-se e teria tido Yen Shih (Yan Shi) executado no local, não tivesse o último, em medo mortal, imediatamente desmontado o robô em pedaços para deixá-lo ver o que realmente era. E, de fato, acabou por ser apenas uma construção de couro, madeira, adesivo e laca, variavelmente colorida em branco, preto, vermelho e azul.

Examinando-o de perto, o rei encontrou todos os órgãos internos inteiros –  fígado, coração, pulmões, baço, rins, estômago e intestinos, e sobre estes novamente, músculos, ossos e membros com suas articulações, pele, dentes e cabelos, todos eles artificiais… O rei experimentou retirar o coração e descobriu que a boca já não podia falar; Ele retirou o fígado e os olhos já não podiam ver; Ele retirou os rins e as pernas perderam o poder de locomoção. O rei ficou encantado.” – É interessante notar que esta maquina lembra em muito os fantoches de Suna.

Kokuo é uma mistura de cavalo e golfinho e seu lado cavalo vem da aventura pela imortalidade, onde Mu é levado por uma carroça.

Obs: Golfinho, em Katakana, é イルカ (Iruka).

Seis-Caudas: Saiken (犀犬 – Cão Rhinoceros)

O nome de Saiken é  provavelmente uma homenagem ao Xīniú (犀牛) o rinoceronte mitológico chinês que poderia se comunicar com os céus com seu chifre.

Na folclore japonês também temos o Inugami – Um cão transformado em Youkai ao ser enterrado vivo (exceto a cabeça), enquanto seus donos contam seus lamentos até sua morte.

Podemos encontrar a lesma no Jiraiya Gōketsu Monogatari, do qual Kishimoto se baseou na criação dos Sannins lendários.

Sete-Caudas: Rakkī Sebun Chōmei (ラッキーセブン重明 – O Brilho esmagador Dos Sete afortunados)

Os sete deuses afortunados são deuses asiáticos que culturalmente passaram a ser representados em conjunto. Foram selecionados por um monge budista que buscava as mais perfeitas virtudes: Longevidade, fortuna, popularidade, sinceridade, gentileza, dignidade, magnanimidade.

Oito-Caudas: Gyuuki (牛鬼 – Vaca fantasma |variação de 牛鬼 – Ushi-Oni – Vaca demônio).

A Ushi-Oni é uma criatura metade vaca/boi e metade alguma outra variação animal – isso porque em cada região ela é retratada de uma forma.

Alguns pontos e variações sobre ela:

  • Entra silenciosamente em celeiros e lambe o gado, para depois então lutar contra eles.
  • Seus chifres são moles e, enquanto conseguem ser extremamente silenciosos, os seus chifres, ao tocar qualquer coisa, fazem um barulho alto.
  • Devora sombras – assassinando assim, suas vitimas.
  • Algumas histórias contam que ela possui o poder de se transformar em mulher. Ela o faz por variadas razões, seja por curiosidade,  fome ou até mesmo por encanto. Há ainda uma história onde uma Ushi-Oni salvou um rapaz de uma inundação em agradecimento. Esta suicidou-se logo após por vergonha de seu feito – acredita-se que ela nutria sentimentos pelo rapaz.
  • Vive em cachoeiras, oceanos, rios e outros lugares aquáticos.
  • Engana pessoas para depois devora-las. Ela faz isso mudando sua forma ou com ajuda da Nure-Onna. Nos dois casos, uma mãe – Ushi-Oni ou Nure-Onna – pede desesperadamente para que segurem seu bebê, que fica preso nos braços da vitima enquanto vai adquirindo peso, impossibilitando-a de escapar.
  • Matá-la ou cultivar ódio por ela pode ser extremamente prejudicial. A pessoa e sua família é amaldiçoada, o que pode levar a doenças e até mesmo a óbito.
  • Em alguns lugares, até mesmo quem vê-la, passa a ser amaldiçoada.
  • Há uma cachoeira em Esumi. Quando a água fica barrenta é aconselhado não ir ao lugar, pois o risco de encontra-la é dado como quase certo. Dizem que seus gritos podem ser ouvidos a noite em todos os dias 23 de cada mês.

Algumas representações:

  • Possui o corpo de aranha ou caranguejo – Estas Ushi-Onis são gigantescas e aparecem principalmente em cidades costeiras.
  • É um boi com cabeça de ogro e nariz vermelho, parecido com o do Tengu (outro Youkai).
  • No vale de Mino, a Ushi-Oni é conhecida por ter cabeça de gato, corpo de boi amarelo com manchas prestas e uma cauda de dez metros.
  • Sobre os fundamentos do templo Negoroji em Takamatsu ,na prefeitura Kagawa, há uma estatua de Ushi-Oni representada como um monstro bipodal com enormes presas, pulsos estimulados e membranas, como um esquilo voador. Um sinal perto explica que esta criatura aterrorizava a área cerca de quatro centenas de anos atrás, e foi morto por um arqueiro habilidoso com o nome de Yamada Kurando Takakiyo (山田蔵人高清). Este dedicou seus chifres para o templo, e eles ainda podem ser vistos até hoje.

Nove-Caudas: Kurama (九喇嘛 – Nove Lamas)

Assim como Son Goku, Kishimoto se inspirou em um personagem de outro mangaká quando deu a Kyuubi o nome de Kurama – No caso, ele referenciou a obra de Yoshihiro Togashi, Yu Yu Hakusho.

As Kitsunes (raposas) são seres extremamente inteligentes, astutos, sábios e poderosos. Em muitos contos elas se transformam em mulheres sedutoras e se casam com humanos, tendo filhos, mas na maioria de suas histórias o fim é trágico – diferentemente dos Tanukis.

Existem dois tipos de Kitsunes: As Zenko ( 善狐 – Raposa boa) e as Yako (野狐 – Raposa selvagem).

As Zenko são servas de Inari – deus da fertilidade, do arroz, da agricultura, da industria e é claro, das raposas. As Yako tendem a ser maliciosas. Tradições regionais adicionam outros tipos de Kitsunes a mitologia, como a Ninko, que só pode ser vista por alguém possuído.

As Kitsunes ganham uma nova cauda a cada cem anos vividos. Quanto mais caudas, mais poderosa uma Kitsune é. Quando ela atinge o limite de nove caudas seu pelo se torna prateado ou dourado; esta Kitsunes especiais ainda adquirem o poder de ver e ouvir todas as coisas, além da sabedoria infinita , isto é, onisciência.

Raposas e Tanukis não se dão bem.

Sim, é o mesmo de Princesa Mononoke.

Dez-Caudas: ダタラ – Datara (デイダラボッチ – Daidarabotchi; Deus De Um Olho Só | 天目一箇神 – O Deus Da Terra; Um Grão De Chuva; Deus Da Amenidade)

Aqui, como podem ver, são várias referencias:

Daidarabotchi: Um gigantesco Yokai. Dizem que, ao dormir tem o tamanho de uma montanha e que os lagos são marcas de suas pegadas.

Ame no Hitotsu no Kami (referencia a Amenominakanushi): De acordo com o Kojiki (a mais antiga crença japonesa), é o primeiro Deus, a fonte do universo, “um deus que se originou sozinho”, o primeiro dos três deuses da criação e um dos cinco kotoamatsukami  (deuses celestiais ilustres).

Obs: Interessante notar que na mitologia grega, o mundo se originou do caos (caos: vazio).


Bem, como descobrimos mais tarde, as Bijuus fazem parte de um selo criado para conter a progenitora do Chakra:

Kaguya Ōtsutsuki (大筒木かぐや – Grande Arvore Kaguya , Grande bambu | 卯の女神 – Deusa Coelho)

Kaguya é uma clara referencia a um dos mitos mais antigos japoneses, “O Conto Do Cortador De Bambu”, esse que por sua vez, foi adaptado recentemente pelo Studio Ghibli com o nome de “O Conto Da Princesa Kaguya”.

Os coelhos e a lua possuem uma relação bem interessante entre si, assim como nós nos referimos, aqui no Brasil, a São Jorge e o Dragão, no oriente referem-se as formas da lua como se fossem um coelho a amassar bolinhos de arroz ou a fazer o elixir da longa vida enquanto acompanhantes da deusa lunar Chang’e.

O porquê do coelho viver na lua está referenciado no Śaśajâtaka, uma antiga história/fabula budista:

“um macaco; uma lontra; um chacal e um coelho decidem fazer o bem no dia sagrado budista de Uposatha (dedicado à caridade e à meditação).

Os quatro animais encontram um velho viajante, a morrer de fome, e dedicam-se a encontrar comida para este:
O macaco, com a sua agilidade, trepou em árvores e colheu diversas frutas; a lontra, como excelente nadadora, mergulhou em um rio próximo e pescou variados peixes; o chacal, intrépido, violou uma casa desocupada e roubou a comida disponível. O coelho, porém, nada pode fazer, a não ser colher algumas ervas.

Triste por não conseguir trazer nada que pudesse realmente ajudar o velho, o coelho se joga na fogueira, oferecendo a si mesmo.

O velho na verdade era o deus Sakra que, comovido, desenhou sua imagem na lua para que todos pudessem sempre recordar.”

A fabula é sobre o valor do sacrifício e, entre as variantes, a divindade é Chang’e e esta salva o coelho da morte e o leva para viver com ela.

Obs: A questão do fruto da árvore pode ser uma referencia a Eva e ao fruto do bem e do mal.

Escrito por Jefferson Venancius

Escritor, redator, roteirista e músico. https://conde.carrd.co

Comentários

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Loading…

Homem de Ferro: Extremis | A redenção de Tony Stark

HQ do Dia | Titãs Vol.1