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Garota Exemplar (2014) | Uma história distorcida e sombria de um relacionamento

Garota Exemplar é mais uma adaptação de um livro homônimo. Sua publicação foi realizada em 2012 e, de lá para cá, o livro figurou váriasresenha-garota-exemplar_4 vezes na lista de mais vendidos do mundo. Isso indica, obviamente, que muita gente o leu, e a pergunta que se faz é: como fazer um filme atraente, quando uma boa parcela da população mundial já sabe de tudo que vai acontecer?

A resposta pode estar na vontade de ver, na película, aquilo que materializamos em nossa tela mental. Garota Exemplar é um filme ousado no sentido de despertar diversas emoções e reflexões no espectador. Muito disso tem o dedo de David Fincher, que já dirigiu filmes como Seven – Os Sete Crimes Capitais, Clube da Luta, A Rede Social, O Curioso Caso de Benjamin Button e os dois primeiros episódios da primeira temporada de House of Cards. Para potencializar o efeito que Fincher exerce sobre o espectador, ele contou com o roteiro assinado pela própria autora do livro, Gillian Flynn. É comum vermos autores de obras adaptadas para o cinema trabalhando como produtores-executivos ou como consultores de produção, mas não é nada comum assinarem o próprio roteiro.

Pelos trabalhos de Fincher, é possível ter uma ideia de como ele interage e brinca com a mente do público – vide Seven, Clube da Luta e, mais ainda, House of Cards, onde ele coloca você como cúmplice de tudo que Frank Underwood faz.

O filme começa mostrando a crise na vida do casal Nick (Ben Affleck) e Amy Dunne (Rosamund Pike), compartilhando a narrativa de cada ponto de vista. O casamento está um caos, a grande crise está prestes a acontecer. Nick está em seu bar, chorando as pitangas do casamento com a irmã, quando recebe um telefonema do vizinho, contando que estranhou algumas coisas em sua casa. Ele sai correndo do bar e vai até sua residência, que fica em Missouri, um dos estados banhados pelo rio Mississipi. Ao entrar em casa, ele percebe um móvel de vidro quebrado, procura Amy por todos os cômodos e não a encontra. Teria ela sido sequestrada? Saído para um passeio sem avisá-lo? Abandonado o marido? Na pior das hipóteses, seria Amy, uma vítima de assassinato?

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Daí em diante, começa o jogo de Fincher com o espectador. Amy Dunne inspirou uma série de livros infantis muito popular, chamada “Amazing Amy“, traduzida para “Garota Exemplar“. Por conta dessa fama, o seu desaparecimento no dia em que se comemorava o quinto aniversário de casamento, transforma-se em um grande parque de diversões midiático e Nick se torna o principal suspeito. A situação piora para o lado dele com a sua forma de reagir a tudo, com seu jeito meio desligado ou displicente, em certos momentos. Ele é altamente manipulável e muitas vezes você acaba sentindo raiva dele ou se perguntando “como pode a esposa sumir e o marido ficar desse jeito?”

Mas essa, caro leitor, é apenas mais uma das brincadeiras que David Fincher faz com o espectador. Posso lhe garantir que você terá, no mínimo, três sentimentos diferentes em relação ao Nick e mais uma série em relação ao filme no geral. Além disso, ele faz uma crítica muito pertinente à sociedade moderna, principalmente em relação a como um caso policial é tratado pela mídia, como essa mania de “selfie” de tudo te afeta de alguma forma, fora a crítica ao matrimônio.

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Por outro lado, nós temos a queridinha da situação, a “Garota Exemplar“, a moça que sempre teve a afeição de todos à sua volta, um exemplo de filha – principalmente pela forma com que seus pais passaram isso para o mundo. Amy tem fãs por toda parte, é doce e sedutora. Do que ela será capaz? Qual é o limite para se conseguir o que deseja? Até onde ir para manter um casamento, mesmo que seja à força?

A cada investida de Nick para dar um desfecho nesta história, ele vai entrando aos poucos numa cama de gato. Dado momento é necessário uma intervenção de peso, e aí entra em cena um dos personagens que quebra um pouco do clima de suspense e mistério. Ele se chama Tanner Bolt, um advogado interpretado pelo comediante Tyler Perry.

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Jeff Cronenweth criou uma fotografia impecável, com cores frias, distanciamento e monocromia para as cenas com Nick e tons um pouco mais quentes, claros e aconchegantes nos flashbacks de Amy. De alguma forma, os tons utilizados nas cenas do lar dos Dunne, fazem com que o público entenda que há algo errado ali.

O filme é longo, são quase 3 horas de duração, algo que poderia ser melhorado. Claro que se trata de uma adaptação, mas duas horas e quarenta minutos de filme não é demais? Isso causa um stress mental, pois você fica naquela ansiedade de ver tudo se resolver logo, e o filme, muitas vezes, patina e testa a sua paciência. Recomendo ir ao toalete antes do longa começar.

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Não tenho como apontar aqui os erros na adaptação ou a falta dela, pois eu não pude ler o livro ainda, mas acredito que pelo tempo de filme e pelo que pesquisei no que repercutiu até o fechamento deste, correu tudo bem.

É inevitável falar do grande nome de Garota Exemplar que, por incrível que pareça, não é a “garota exemplar”. Ben Affleck está nos holofotes por causa de Batman v Superman: Dawn of the Justice e, claro, acabou repercutindo neste trabalho. Muitos vieram me perguntar sobre sua atuação, e o que respondi foi que ele não é um ator ruim, e devo dizer isso pensando, até mesmo, se um dia foi. Muitos o criticam por trabalhos como Armagedon, Demolidor, Forças do Destino, entre outros, e essas críticas se intensificaram quando seu nome foi escolhido para ser o próximo Batman dos cinemas, mas creio que, sendo o grande ator que é, Affleck será um ótimo cavaleiro das trevas, assim como foi um ótimo Nick em Garota Exemplar. Há uma cena em que eu brinquei dizendo que era um easter egg de Batman v Superman, espero que você note, mas foi apenas uma brincadeira, não tem nada a ver uma coisa com a outra… Ou será que tem?

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O filme, no geral, é ótimo. A imprensa americana já ameaçam um “Já ganhou!” depois da apresentação triunfal no Festival de Nova York. Muitos fãs do diretor David Fincher já dão como certa a sua vitória no Oscar 2015, mas eu fico pensando se ele tem fôlego para segurar o que vem por aí até lá.

Fico aqui tentando demonstrar o quanto esse filme brinca com o espectador, cada ponto do que vivemos em sociedade pode ser discutido, o casamento, o uso das redes sociais, a exploração da mídia, como tudo muda de figura quando se muda o ponto de vista sobre algo e, até mesmo, a capacidade do ser humano de testar o limite de tudo para conseguir o que quer. Digo mais, a capacidade de fazer o possível e o impossível, até beirar a psicopatia, para manter não só as aparências, mas tudo que se conquistou um dia. Ao assisti-lo, me lembrei muito De Olhos bem Fechados de Stanley Kubrick, ora pelo cinismo do casal, ora pelo desfecho da história. Prepare-se para sair do cinema com o modo “reflexão” ligado.


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Escrito por Bruno Fonseca

Fundador e editor-chefe do PL. Jornalista apaixonado por quadrinhos, filmes, games e séries.

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