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American Crime Story | Review do ep. 1×01 “From the Ashes of Tragedy”

Finalmente foi lançado o episódio piloto de American Crime Story: The People vs O.J. Simpsonprimeira temporada de uma nova antologia encabeçada por Ryan Murphy (American Horror Story, Scream Queens, Glee) que promete abordar, a cada ano, crimes reais que tiveram grande repercussão nos EUA e no mundo. Murphy não quis chegar de mansinho e escolheu logo algo bem polêmico para começar seu novo projeto. Armado com um elenco que conta com Sarah Paulson (AHS), Cuba Gooding Jr. (Jerry Maguire), David Schwimmer (Friends), Selma Blair (Segundas Intenções), Connie Britton (Nashville), Sterling K. Brown (Person of Interest), Courtney B. Vance (State of Affairs), John Travolta (A Outra Face), ele apresenta o que pode ser um marco na forma como as séries criminais abordam seus personagens.

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Em primeiro lugar, preciso apontar o quanto a série é extremamente bem produzida. Cinco minutos de episódio e o programa já deixa o público de queixo caído pela rica cinematografia e pelas performances quase uniformemente magistrais. Um dos crimes mais famosos da história dos Estados Unidos ganha uma abordagem emotiva, contextualizada e repleta de suspense.

Vamos contextualizar: afinal quem é O. J. Simpson? O que ele fez?

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Orenthal James “O. J.” Simpson também apelidado de “The Juice”, é um ex-jogador de futebol americano, radialista e ator. Como jogador, iniciou sua carreira profissional no Buffalo Bills em 1969 e jogou até 1977, conquistando ao todo 4 títulos da NFL. Em 1978 assinou com o San Francisco 49ers, onde jogou por duas temporadas antes de se aposentar. Como ator, trabalhou em séries como “Medical Center” (1969) e “Raízes” (1977), e em filmes como “O Homem do Klã” (1974) , “Inferno na Torre” (1974), “A travessia de Cassandra” (1976) e “Capricórnio Um” (1978). Inclusive, nos anos 80, Simpson quase estrelou “O Exterminador do Futuro”.

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Mas sua carreira foi destruída quando O. J. Simpson se tornou protagonista do julgamento mais polêmico dos anos 90. Nicole Brown, ex-garçonete que se casou com o jogador em 1985, já tinha feito diversas denúncias contra a violência doméstica que sofria. O divórcio aconteceu em 1992 e havia registros policiais de três agressões físicas de Simpson contra Nicole, além da denúncia dele ter quebrado, com um bastão de beisebol, os vidros do carro da esposa, onde ela havia se refugiado depois de uma discussão. Em 1993, Simpson chegou a invadir a casa da ex-mulher, que se trancou na cozinha.

Nicole Brown e Ron Goldman

No dia 12 de junho de 1994, Nicole Brown foi assassinada a facadas em sua casa em Brentwood, Los Angeles, junto com seu amigo Ronald Goldman. Nos dias que se seguiram a perícia começou a revelar evidências que cada vez mais incriminavam O. J. Simpson, como: gotículas de sangue das vitimas em meias de O. J., gotículas do sangue dele na calçada da casa, uma luva na cena do crime que formava um par com uma luva encontrada na casa de O. J., pegadas compatíveis com o tamanho de seus pés, entre outras. Após a prisão de O. J. se deu início ao processo judicial que ficou conhecido nos EUA como o julgamento do século, que começou em 26 de setembro de 1994 e durou 372 dias.

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A defesa de O. J. conseguiu suprimir uma parte das evidências de acusação, articulou uma das estratégias mais eficazes já vistas em um tribunal e combinou tudo a uma forte tensão racial, chegando a alegar que O. J. era vítima de racismo por parte da polícia de Los Angeles. O veredito foi transmitido ao vivo para mais de 100 milhões de telespectadores: O. J. Simpson foi considerado inocente de assassinar Nicole e Goldman, em um julgamento criminal extremamente controverso. Mais tarde ele foi considerado responsável pelas mortes em um termo civil movido pelas famílias das duas vítimas.

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Voltemos a falar sobre a série:

Quando se trata de um filme ou série sobre um criminoso, é esperado que ele seja o vilão da história. É assim que o vemos, certo? E é quebrando esse paradigma que American Crime Story se destaca. Até agora, o roteiro traz consigo um raro sentido de compaixão por O. J. Simpson. Ele não é puramente o monstro, tirano, narcisista e sangrento que vem às nossas mentes quando sabemos de sua história. Ele é um homem, um pai, amigo, ex-marido e filho, que está apenas no início daquele que será o pior pesadelo de sua vida. Cuba Gooding, Jr. está sensacional. Há muito tempo um ator não conseguia despertar minha empatia pelo “vilão” da história e ele conseguiu sem esforço.

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Por que ele foi absolvido? É fácil dizer “Por causa da etnia”, e uma série que não estivesse tão dedicada à sua história quanto American Crime Story com certeza faria essa abordagem. Mas talvez essa resposta não seja inteiramente correta (embora um jurado afro-americano, quando questionado sobre seus motivos para votar pela absolvição, respondeu: “Nós temos que cuidar dos nossos”). Na minha opinião, O. J. Simpson foi absolvido porque tinha uma equipe de defesa impiedosamente brilhante, enfrentou uma acusação incompetente, e porque a polícia de Los Angeles era uma força corrupta que, para muitos, merecia a humilhação. Vale lembrar, também, que a misoginia reinou na época, tendo ocorrido até mesmo a exposição de fotos íntimas da promotora Márcia Clark.

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É preciso também contextualizar a época em que o julgamento aconteceu, e a série faz isso. O primeiro episódio inicia com vídeos do caso Rodney King, um taxista afro-americano que foi violentamente espancado pela polícia de Los Angeles em 3 de março de 1991. A cena, registrada em vídeo por uma testemunha, correu o mundo, e a absolvição dos policiais em 29 de abril de 1992 desencadeou os distúrbios de Los Angeles em 1992 – milhares de pessoas na área de Los Angeles se revoltaram ao longo dos seis dias após o veredito provocando um conflito racial, saques, assaltos, incêndios, assassinatos e danos materiais, causando cerca de US$ 1 bilhão de prejuízo. Ao todo, 53 pessoas morreram durante os tumultos e milhares mais foram feridas.

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E o que é mais assustador: ainda hoje vemos os conflitos raciais mais fortes do que nunca, ainda mais nos EUA. Ferguson. Baltimore. 2015.

É por isso que eu acho que American Crime Story: The People vs O.J. Simpson é a série mais importante de 2016: à sua maneira, ela está nos mostrando porque é melhor evitar o instinto de generalizar, odiar e perpetuar a violência. Você simpatiza com as minorias étnicas sistematicamente oprimidas? E quanto às vítimas de violência doméstica? Você é a favor de pessoas ricas comprarem seus julgamentos? Mas e sobre a corrupção policial? Celebridades estão acima da lei, ou são muitas vezes acusadas injustamente? O julgamento de O. J. Simpson levou uma nação inteira à loucura porque fez com que as pessoas percebessem que nem tudo é “preto e branco” – uma razão pela qual esta série é absolutamente perfeita para os nossos tempos. Tudo isso ainda está acontecendo.

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Vivemos em uma época de dois extremos: estamos reconhecendo cada vez mais que a desigualdade racial existe e ao mesmo tempo estamos cada vez menos dispostos a examiná-la com a complexidade que merece. Continuamos a estereotipar uns aos outros; continuamos a lutar contra os estereótipos; continuamos a perpetuar os ciclos terríveis que ameaçam nos condenar.

American Crime Story: The People vs O.J. Simpson pede para cada um de nós sentarmos reexaminarmos nossas certezas, mostrando o que eu acho que para muitos será um dos fatos mais surpreendentes sobre o caso: O.J. Simpson é humano. Essa série não quer dar todas as respostas, mas nos perguntar: por que Simpson fez isso*? Por que o veredito de um simples assassinato duplo foi um desastre? Por que Nicole e Goldman nunca tiveram a justiça que merecem?

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Para mim, este é um dos atos mais corajosos de storytelling na memória recente. É também uma mensagem que todos nós precisamos desesperadamente ouvir.

*Embora tenha sido absolvido, O. J. Simpson revelou que matou Nicole Brown e Ronald Goldman em seu livro “If I Did It”.

O livro que deu origem à série – “American Crime Story: O povo contra O.J. Simpson” – escrito por Jeffrey Toobin será lançado em março pela DarkSide® Books. Clique aqui e saiba mais!


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Escrito por Louise

Amo, respiro e me alimento de quadrinhos, acho completamente normal se envolver emocionalmente com personagens de séries e filmes, e já vou avisando: NÃO MEXA COM MEUS HERÓIS!

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